O clube

Inglaterra, década de 30. Uma turma de acadêmicos de uma das mais famosas universidades do mundo, a Universidade de Oxford, resolve criar um grupo para discussão de literatura.  As reuniões eram bem informais e o grupo mais ainda, com alguns poucos membros, todos homens,  participando cada um à sua maneira e com suas ideias.

Montar um grupo de literatura podia até ser uma ideia comum, mas seus membros já não eram caras tão comuns assim. Eles se auto intitularam “The Inklings” e decidiram que queriam sim falar de literatura, mas não ~só~ de literatura. A ficção era aquilo que de fato os unia, tendo ainda um outo elemento em comum: a fantasia. A deliciosa e encantadora fantasia.

Começaram a se reunir num bar que ficava ali perto chamado The Eagle and Child (A águia e a criança), mas que tinha um nome muito mais carinhoso entre eles The Bird and baby (O pássaro e o bêbe). Posso até imaginar alguns de seus encontros, com todos aqueles homens sentados ao redor de uma mesa. Acompanhados de alguma bebida qualquer, com vontade de expressar suas ideias, de desabafar seus dilemas – acadêmicos ou literários – e de conversar um pouco com outros homens que sabiam o quanto o sonho faz um bem danado para qualquer um. Em qualquer idade. Em qualquer lugar.

Um desses caras era africano, mas morava ali na Inglaterra desde muito pequeno. Apaixonado desde sempre pela literatura, não teve dúvidas em cursar a faculdade de Letras. Anos depois, ali em Oxford, seria uma dos professores mais reconhecidos da universidade, onde lecionava anglo-saxão, inglês e claro, literatura inglesa.

O outro era irlandês, mas tinha ido para a Inglaterra para fazer faculdade. Amava os livros, com todo fervor. Com três anos já vivia em um mundo imaginário, fazendo questão que a família o chamasse de “Jack”. Aos 10, perdeu a mãe, e junto com seu irmão encontrou nos livros ainda maior refúgio.

Eles se conheceram no grupo e viram que tinham muito mais em comum do que a literatura. Se tornaram amigos, grandes amigos. O fato de um ser um católico praticante e o outro um ateu convicto – mais tarde ele iria se tornar protestante o que desagradaria ainda mais ao amigo – foi um entrave na amizade. Quando a crença e a literatura de ambos de misturavam, as constantes brigas eram inevitáveis. E essa mistura de fantasia, fé e crenças era, para ambos, muito mais comum do que se possa imaginar.

Um deles se chamava John Ronald Reuel Tolkien, ou como você deve conhecer J. R. R. Tolkien, o “cara que escreveu O Senhor dos Anéis.” O outro se chamava Clive Staples Lewis, ou como você deve conhecer C. S. Lewis, o “cara que escreveu As Crônicas de Nárnia”.

A primeira vez que eu escutei falar de “O Senhor dos Anéis” foi pela minha irmã. Lembro que ela trouxe o livro pra casa (aquele com os três livros juntos, enorme que só ele) e começou a ler e me contar o quanto tava amando. Eu, uma pequena devoradora de livros, não aguentei e comecei a ler junto com ela. Depois ainda viriam os filmes, que me prenderam tanto quanto o livro, e que me mantinham fascinada com a ideia de um mundo paralelo tão absurdamente bem planejado. Não conseguia, – e ainda não consigo – pensar em outra palavra que não seja perfeição para a descrição dos personagens, da Terra Média, de todos, absolutamente todos os detalhes da história.

Já “As Crônicas de Nárnia” surgiram faz pouco tempo na minha vida. Não havia visto nenhum dos filmes, não sabia absolutamente nada da história – muito menos sobre os “The Inklings” – mas um belo dia encontrei o livro (mais uma vez a versão com todos os livros juntos) na biblioteca da minha faculdade e voilá, logo ele foi parar nas minhas mãos.

Finalizados os três primeiros livros de “As Crônicas de Nárnia” eu fiquei pensando o que era aquela sensação quente que eu sentia aqui dentro do peito quando lia aquela história. Lembrei que havia sentido algo parecido com “Senhor dos Anéis” e com “Harry Potter” e tentei achar algum ponto de ligação entre aquelas três histórias, tão diferentes entre si, mas que despertavam em mim aquele mesmo sentimento. Até que de repente a resposta apareceu na minha frente assim, quando menos esperava.

A fantasia.

Quando descobri sobre o “grupo de literatura” de Oxford eu fiquei encantada. A própria história me parecia bonita demais, me parecia até mais uma das histórias do próprio Tolkien ou do Lewis, com a cereja no topo do bolo de que eles agora também tinham virado personagens. Mas não. Ela era real. Era completamente real.

Penso cá com meus botões que o mundo é um lugar muito mais encantador, mais quente, mais bonito de se admirar quando colocamos um pouco de magia no dia a dia. Não precisa ser a louca que não sabe viver no presente e encara tudo como um conto de fadas. Não to falando disso. To falando de simplesmente imaginar que, de vez em quando, o que a gente chama de coincidências, de felicidade, de realização, a gente podia simplesmente chamar de magia. De acreditar que a gente pode criar uma história pra nossa própria vida e seguir aquela história da maneira mais verdadeira que a gente puder. Porque afinal é a gente sim quem escreve nossa história. E se a fantasia pode ser um aliado pra fazer você sonhar com o que quer pra sua vida, porque deixa-la de lado? Tudo pode, e deve, ser mais do que obrigação, mais do que fazer por fazer. E só a fantasia, a magia nos proporciona isso.

Eu fico pensando que se dois caras lá na década de 30 queriam mostrar pro mundo, cada um do seu jeito e com suas verdades, o quanto a fantasia é importante, eles mostraram muito mais do que isso. Eles mostraram que ela não é importante, mas sim necessária pra se viver. E eu só tenho a agradecer.

Um obrigada a cada um dos “The Inklings”.

Obrigada Tolkien.

Obrigada Lewis.

Eu entendi o recado (;

Lá na ilha da Magia

A família do meu pai é toda do sul, assim, no sentido geral mesmo, sem nenhuma área específica. Todos sempre foram bem espalhados pela região, dificultando ainda mais nossas visitas. A distância, a não convivência desde sempre – nasci quando meu pai já havia se mudado para o interior paulista – e a vida-nossa-de- todo-dia impediram que eu os visitasse mais. Meu pai foi algumas vezes sozinho, mas a última vez que lembro de viajar para as terras geladas do sul do país foi lá pelos meu oito anos de idade. As lembranças são poucas, bem poucas, e há todo um outro sentido quando você cresce e volta a lugares da infância. Viajar com seus pais é ótimo, mas viajar depois que você já saiu de casa, depois que você aprendeu a caminhar com suas pernas é uma diferença assombrosa. É apreciar as coisas de forma mais madura, de saber curtir e entender as diferenças da cultura local, aprender com outras pessoas, com outros lugares, com outras sensações. E daí que meu destino da semana passada foi um desses lugares que já havia visitado quando pequena, mas que ganhou todo um outro significado quando re-conhecido.
O destino foi Florianópolis, ou como é popularmente conhecida e eu prefiro chamar, Ilha da Magia.

Imagem 12 e 3 via weheartit

O motivo da viagem foi profissional, já que fui para Floripa trabalhar no 5º CIDI – Congresso Internacional do Design da Informação. Além do que eu aprendi nesse trabalho, houve todo um aprendizado fora ele, focado nessa cidade linda e limpa. E a ênfase do limpa aí é toda verdadeira, porque de todas as coisas que mais me surpreenderam em Florianópolis, limpeza  e educação no trânsito estão no top five. Foram dias e mais dias de chuva – o senhor sol só resolveu nos dar um olá no último dia – e ainda assim, depois de tanta água rolando, a cidade continuava do mesmo jeitinho. Organizada, com as ruas livres e as calçadas te convidando para uma caminhada. Nada de lixo entupido em bueiros, nada de quinquilharias trazidas pela água.

Quanto ao trânsito, bem, eu estaria mentindo se dissesse que não escutei uma buzina, porque foi bem isso mesmo, escutei apenas uma buzina num momento em que o ato se fazia necessário. Ai, que bom seria se o silêncio fosse assim sempre bem-vindo. Assim como a educação em parar o carro assim que você coloca seus pés na faixa de pedestre.

E aí que a Ilha da Magia não estava apenas satisfeita em me encantar com sua estrutura urbana, mas tinha que me encantar também com suas praias, com a Lagoa Conceição, com Santo Antônio de Lisboa…

Santo Antônio de Lisboa foi o local escolhido para o nosso jantar do primeiro dia – as comidas da viagem mereciam um post a parte, mas tudo bem – e não poderia haver melhor apresentação. O lugar é um vilarejo de Florianópolis de colonização açoreana que te faz imaginar estar entrando num mundo paralelo ao real. A arquitetura não mudou ao longo dos anos, e até seus habitantes parecem ter parado no tempo. Ainda hoje as festas de antigamente são preservadas, como a Festa do Divino Espírito Santo, o Termo de Reis e o Cacumbi. Tudo acontece num outro tempo, num outro mundo. Ladeando o vilarejo está o principal astro do lugar, o mar, já que a pesca é o que movimenta o comércio local. Olha, vou dizer que foi uma das cenas mais lindas da minha vida sentar em frente aquela imensidão azul e ver aqueles barquinhos pesqueiros espalhados pela água.  Me lembrou “Impressão, nascer do sol” do Monet.

"Impressão, nascer do sol" Claude Monet (1872) - considerada a principal obra do movimento Impressionista

Como o motivo da viagem foi trabalho e não passeio, até o almoço de quarta-feira passei a maior parte do meu tempo na UFSC, a Universidade Federal de Santa Catarina, sede do evento. Vou contar que apesar de todas as reinvindicações, da tomada da reitoria e de todas as coisas que estavam rolando na faculdade nesse tempo, eu vi muita pouca coisa, porque o CIDI rolou em um prédio afastado das manifestações.

Os prédios da faculdade eram totalmente espalhados por uma área sem cerca, como se fosse uma grande praça com vários prédios ao redor. Há uma outra interação entre faculdade e cidade, tornando o espaço como um lugar público e relacionando cidadãos e estudantes. Bem diferente das grades das nossas faculdades daqui. E isso nem é uma crítica, só acho que essa interação acontece de forma diferente pela localidade e pelas questões culturais, o que não deixo de apreciar.

No evento conheci pessoas de todas as regiões do Brasil, e muitos de fora do país. A professora Catherine Dixon, da Central Saint Martins (olhos brilhando), o professor Fábio Campos, com quem tive um dos papos mais incríveis sobre tecnologia/videogame, estudantes de graduação e pós da PUC-Rio e uma infinidade de gente que tornou minhas noites e meus jantares mais interessantes e proveitosos.

Aliás, a comida…

Eu poderia falar sobre todas as coisas boas que provei em Florianópolis. Poderia falar que o peixe deles é o nosso feijão com arroz, e que mesmo sendo apaixonada por peixe, minha alergia não permite que eu coma muito. O jeito é apelar para outras opções. Poderia falar que visitei lugares incríveis, como o Restaurante Chão Batido que fica em Santo Antônio de Lisboa, ou do restaurante que tem a “sequência de camarão”, que é o prato típico da ilha. Mas não posso deixar de falar que provei o melhor risotto da minha vida! O lugar chama Café Cultura, é um bistrô bem simpático e com ótimo atendimento. Se for, não deixe de provar o risotto de filé ;) A comida do hotel também é gostosa e os quartos são muito aconchegantes. Recomendo também.

Mas a melhor parte da viagem ainda estaria por vir. Na quarta-feira, penúltimo dia e único em que aquela chuva fina e rala resolveu ir embora e o sol se prontificou a aparecer, logo depois do almoço e do fim oficial do congresso, nós fomos de fato conhecer a cidade. Primeiro o lado sul. A praia da Joaquina, ou praia da “Joaca” é assim… linda. E vou dizer que nem liguei para o fato de ter saído toda empolgada para o mar e ter quase congelada quando a água chegou até mim – a praia é a mais gelada de toda a ilha. Ainda no sul da ilha fomos correr nas dunas e enquanto estávamos lá havia uma equipe de filmagem gravando uma cena, mas não faço ideia para onde era. Então, se me ver aparecendo de feliz em algum lugar por aí, favor avisar.

No lado lesta da ilha conhecemos a Praia Mole que tem um nome bem condizente… mesmo no raso quanto a água sobe e chega até a praia, a areia afunda. Por esse motivo ela é mais frequentada por surfistas e os banhistas acabam preferindo outras praias com menos aventura e nada de surpresas :P

Durante o trajeto para o norte paramos no mirante da Lagoa da Conceição que é passagem obrigatória para quem for para a cidade. A Lagoa, inclusive, é a parte mais agitada da ilha, cheia de restaurantes e bares que agitam a vida noturna de Florianópolis.

Finalmente no lado norte da ilha conhecemos a Praia das Canasvieiras. Trouxe uma conchinha de lá, que foi um dos presentes de viagem para o Di. Por último fomos tomar um café em Santo Antônio de Lisboa, e andando pelas ruas do lugar, deu ainda mais vontade de voltar para lá e conhecer melhor cada canto daquele vilarejo.

Mas né, o passeio acabou, quinta-feira estava de volta à Bauru e na sexta já voltei para a realidade. Não que seja ruim, mas Florianópolis me deixou com um gostinho de quero mais. Bom, final do ano já tá quase aí mesmo. Quem sabe, né…

As fotos abaixo foram tiradas no passeio do último dia.